tabula rasa

t a b u l a r a s a | A l t e r E g o | d e I m p r o v i s o

...deImproviso

a vida é um improviso constante.

b l o g
________________________

T a b u l a R a s a P l a y e r

________________________

________________________
PUB




________________________

improviso 2

Caio nesta corrente de saudades. Sinto o sabor das noites do passado, sinto o cheiro das árvores, dos perfumes nos pescoços desbotados ao fim da noite. Sinto o frio na barriga que sentia por percorrer a noite na marginalidade da adolescência, que de marginal apenas tinha o álcool e as horas impróprias, tardias, nos locais mais estranhos que conseguíssemos encontrar.
Começo a entrar na espiral, na velha espiral, neste canal descendente que me suga cada vez mais e do qual, ultimamente, tem sido cada vez mais difícil sair.
Já era tão fácil espreitar um bocadinho pelo poço e sair a seguir... Mas a acumulação de tudo na caspa quotidiana dos ombros tem feito curvar a vontade de não cair, e dou por mim a olhar para baixo com os braços escancarados num sorriso.
Não quero magoar ninguém, não quero fazer qualquer tipo de jogo, que fique bem claro, mas existem coisas que tenho que dizer, existem sentimentos que me surgem e dos quais não me consigo libertar, coisas que nos podem magoar como o sono incontornável que ao volante de um carro, nos cerra à força os olhos.

Onde estás Princesa Desalento? Irmã da minha angústia, da minha tristeza... Onde estás melodia de viola baixo, perdida pela cidade onde sufoco no meu vómito intoxicado?
Onde estás Escultura-branca, utopia juvenil? Onde caíste durante estes anos nos quais te foste apagando? Caíste ao mar?... Onde estás Boneca-de-trapos cor-de-rosa por quem um dia me apaixonei e nesse mesmo dia virei as costas? Onde está a Irmã que já foi minha amante noutra vida sem tabus e receios? Onde estão os seus beijos perfumados que se colavam aos meus lábios numa goma doce e carnuda, numa massa de pão ardente tão junto a mim que podia ver cada pedacinho dos seus olhos olhando para mim num entendimento profundo.
Onde estás Lilás? Cor nocturna dos subúrbios onde os ursos de peluche vivem nos telhados de casas velhas ao sol e à chuva? Onde estás Lilás, paixão cega, retrato do amor dos adolescentes que se estilhaça porque no fim ele morre sempre?...
Onde estás Azul? Apesar de no fundo não querer saber. Onde estás Morena Nuance? Onde estás decadência de preto vestida e hálito doce que repugna? Onde estás duende tímido, Pixie dos subúrbios tão frágil como Sininho? Onde estarás?...
Onde estão todas as vontades que tive? Onde estão todas as vontades que ainda tenho?
Onde estás Camisola-de-lã à beira mar? Sorriso abandonado e sem dono, que pagas o preço da solidão por encantares todos com ele...
Onde estás Cura e doença, por onde caminham as tuas botas? Por quem choram os teus olhos?... Não os que tens no rosto, porque tu não choras, mas aqueles que tens dentro do teu peito num Jardim Suspenso.
Onde estás ausência da saudade? Onde estás sótão onde mora o meu Corvo?
Já não vejo nada, já não vejo ninguém. Sinto que o tempo se esgota, sinto medo da minha loucura, sinto que o tempo desaparece mascarado na embriaguez do dia a dia. Estou a morrer e nada pode ser feito. Estamos a morrer e fingimos que é a brincar, fingimos que não estamos diferentes, fingimos que nos vestimos da mesma maneira, fingimos que tudo é igual para não desatarmos aos gritos no pânico de nos apercebermos onde chegámos.
Confesso agora, porque chega uma hora em que não podemos mentir, nem fingir que é outro que sente o que sentimos. Confesso agora que me faria bem abrir as comportas do desabafo no colo de alguém que não sei onde está.
Onde estão todos os comboios que já apanhei? Não! Já não adianta fugir em todas as direcções porque todas elas me conduzem até mim próprio. Onde está a praia solitária que de noite exala o cheiro do frio e onde corre o som das ondas no escuro do mar ali à beirinha? Onde está a praia onde as esplanadas hibernam no escuro salgado do inverno?
Onde estou? Agora que voltei ao início e não disse absolutamente nada?
blog comments powered by Disqus
Free Web Hosting